A prudência do Urso
Apesar de a URSS e os Estados Unidos, cada um com as suas nações aliadas, se terem defrontado numa guerra cujos tiros apenas foram mandados por procuração, ninguém viu um tiro entre um soldado soviético e um americano, ou entre um soldado da NATOP e um do Pacto de Varsóvia. Houve alguns incidentes nucleares em 1984, que quase resultaram num confronto aberto, e só sabemos deles hoje, a esta distância. Havia uma grande compenetração de ambos os poderes opositores que armas nucleares estavam prontas a ser lançadas pelo adversário a qualquer altura. Caso o fossem significaria grandes perdas para todos, aliados e opositores. O lobo ocidental e o urso oriental mediam-se continuamente, olhavam-se nos olhos, e sabiam que qualquer confronto era impossível de ganhar por qualquer lado. Fosse qual fosse o animal sobrevivente, a gangrena assegurava-lhe a morte.
O medo de se armar em tolo aguçou a prudência tanto no bloco ocidental como no comunista. Os russos, como cantava Sting nos anos 80, também amavam as suas crianças. Qualquer capitão americano ou soviético que se armasse em herói podia contar com o fim da sua carreira e, bem certamente, um desaparecimento rápido provocado pelos serviços secretos. O medo que aparecesse num bloco ou noutro algum émulo do General Jack D. Ripper (do filme Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb, de Stanley Kubrick), e que, contra tudo e contra todos, iniciasse um tétrico suicídio global, era mais temido do que ter mais ou menos forças convencionais no terreno. Nesses dias, a prudência dos governantes fez claro que iniciativas privadas de um qualquer general não seriam permitidas.
O Dragão esconde-se à vista de todos
A retórica chinesa é diferente. Quem lê os discursos em mandarim fica com a ideia de que os chineses estão a encorajar o surgimento de uma dessas iniciativas por parte de um chefe de brigada qualquer, algures, seja em relação à Índia ou, especialmente, nos diversos arquipélagos do Extremo Oriente que são disputados por vários países. Os líderes chineses sabem bem que podem neste momento subjugar Taiwan, o Japão, as Filipinas, a Coreia do Sul OU o Vietname. Mas não podem subjugar Taiwan, o Japão, as Filipinas, a Coreia do Sul E o Vietname, especialmente sabendo que os Estados Unidos têm tratados de defesa mútua com quatro destes países.
É costume procurar um inimigo externo quando internamente as coisas estão prestes a destrambelhar. A China já está perto do ponto de não conseguir esconder os pés de barro poroso de uma estátua de metal. A bolha de crédito chinesa faz a ocidental (que levou à crise de 2008) um mero aborrecimento com formigas num piquenique comparado com um ataque de locustas. Os líderes chineses sabem disso. E estão prestes a, como Clinton fez na Jugoslávia, de desviar as atenções internas começando uma guerra. Sem ordem superiores, através do sacrifício de uns estouvados que procuram glória patriótica atacando forças que, sabem os líderes, irão derrotar os seus heróis na primeira parte do filme. Com a vantagem de se poder negar que os líderes chineses alguma vez tenham dado ordem para começar a guerra e desviar as atenções da economia.
Os líderes do partido comunista chinês estão à procura de mártires. Espero, para o bem da China, que não os encontrem. A China é um país por demais culto e valoroso para que se entregue à volição de uns quaisquer ditadores, que desejam poder desviar a culpa do eminente e iminente colapso de si próprios.
Quem acha que a China Comunista é uma nação pacífica esquece ou não conhece os conflitos armados contra a Índia em 1962, contra a União Soviética em 1969, a ocupação do Tibete, a guerra de 1979 a 1987 contra o Vietname e rumores de ocupações no Laos.
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